quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A MODOS QUE PERDIDO

Parte 1 – a primeira

“meu sangue é de gasolina, correndo não tenho mágoa”


Abro um olho: ao meu redor está tudo negro! Mantenho o outro olho fechado mais um pouco em sinal de estranheza e depois abro-o também. As palavras saem-me assim num repente mas não estou certo do que querem dizer. Sinto a boca seca e a garganta inchada. Ergo a cabeça, pesa como chumbo e doí que se farta...Estou deitado no chão, levanto-me e verifico que não sei onde estou. Ó diabos! Que ser é este cheio de dores e interrogações... Sou eu, é claro... Mas quem sou eu?
Começo a explorar o espaço,é composto por vegetação colorida e assentos de madeira. Dou alguns passos e recordo-me que sou habitante do planeta Terra e que o mundo é organizado por signos; porém ainda não vejo nada disso, nem qualquer outra coisa, está escuro. Jogo a mão ao bolso e tiro de lá uma pequena garrafa com um liquido amarelo no interior. Olho para ela uns segundos, é mais familiar que tudo o resto, tiro-lhe a tampa...incrivel. E dou uma grande golada, isto aconchega-me um pouco. A dor de cabeça diminui. Não se vê ninguem e continuo a caminhar, saio do jardim, estou numa zona só com casas , sem pessoas... Ó DIABOS,é tudo tão enigmático! Passo toda a noite a andar pelas ruas e não vejo ninguém, começa a nascer em mim uma tremenda sensação de medo.Tenho cá para mim que sinto esse medo á muito tempo, já devia estar com medo antes de me acontecer o que aconteceu; temia, talvez, que me acontecesse o que me deve ter acontecido..bom, não sei mas acho que há algo de mau que ainda vai acontecer. As questões são muitas: serei daqui ou alguem me trouxe até este sitio inóspito? será que me querem eliminar? Porque é que estou a falar sozinho? A expressão alvo a abater vem-me á ideia e segundos depois surge também o seu significado, fico arrepiado....o passado persegue-me , se ao menos me lembrasse dele poderia tentar esquecê-lo. O dia lá acaba por nascer, continuo a andar. Sinto um vazio no estômago. Bom, mais uma vez emborco um pouco do liquido amarelo. Apercebo-me de alguma circulação nas ruas, o melhor é falar com alguém, mas tenho medo... um medo terrivel de tudo o que me rodeia... O que será que faço para ganhar vida? Não pareço lá muito audaz! É isso, talvez o meu trabalho possa ser a razão de toda esta embrulhada. Se calhar ando numa missão secreta, super-secreta pelos vistos... Bom, o melhor é falar com alguém... Encho-me de força e sigo na direcção de uma pessoa, estou cada vez mais perto e consigo perceber que é uma velhinha com ar amistoso. Esta minha loquacidade leva-me a crer que sou uma pessoa instruida. Intercepto então a idosa e pergunto se me pode dizer onde estou, ela começa a dizer palavras estranhas, diferentes daquelas que me têm saido da boca e que não compreendo. Enquanto a ouço recordo-me de toda a problemática dos paises e das línguas e torna-se claro que não sou daqui. A velhota acena-me com uma coisa redonda que tira de uma caixa, um gato, um gato é o que ela me parece dizer, não identifico a coisa há primeira mas aceito, não me lembro para que serve mas acho que já tive um coiso destes na mão! Perante a minha hesitação ela pega noutro coiso igual e leva-o á boca, haaa... trinco também o meu, é para comer, ela lança-me um sorriso e continua o seu caminho. Continuo a mastigar, é agradável.. A cabeça volta a doer-me e bebo mais um bocado do liquido amarelo. Enquanto vagueio reparo em todas as placas afixadas na rua, nada percebo, os outros olham-me com uma certa obliquidade, todos devem saber que não sou daqui. Pior será se todos me conhecerem, sendo um alvo a abater tenho que me pôr a pau.
A mesma velhota volta a passar por mim vinda de outra direcção e oferece-me outro coiso, aceito com agrado porque a fome continua e até me lembro que lhe chamo bolo, e digo á senhora: bolo, ela sorri e parece que me convida para caminhar com ela. Raios, isto começa a ficar esquisito, fico reticente e ela insiste a sorrir e aquele sorriso que já me pareceu tão candido revela-se agora completamente maquiavélico. Começo a correr...

Durante a corrida penso, sem abrandar o ritmo, se os bolos da velha não seriam perigosos, se tiverem veneno este já está completamente entranhado no meu sangue. Começo a ver uma outra mulher lá ao longe, conforme me vou aproximando sinto um cheiro agradável, feminino...Olho para a mulher, é muito mais atraente que a velhinha, ela acena-me... Ó Diabos, eu conheço-a...Ela chama por mim “Alberto, anda para casa Alberto”?!? É a minha mulher,não recordo o seu nome mas sei que é ela e fico contente por ter uma, e ainda por cima tão bonita. Por segundos penso que os mistérios vão começar a desvendar-se mas logo começo a ficar desconfiado, ela pode ser uma armadilha, mais uma... Mudo de direcção quando estou prestes a alcançá-la, afinal se não tenho memória como posso ter tanta certeza que ela é a minha mulher, naaa...a velha deve ter-me drogado com os bolos... Ao virar da esquina torno a encontrar o raio da velha e a sua caixa, desvio e chego perto de um jardim. Tem ares de coisa antiga, subo uma escadaria e deito-me debaixo de uma cruz em pedra com uma figura cruzificada...hah, tanto simbolismo e eu incapaz de percebe-lo. Volto a avistar a velhota, parece que se dirige para aqui, como é que ela consegue estar em todo o lado? Será que me persegue? Sinto um arrepio na espinha, tenho quase a certeza de que sou vitima de uma cabala! No meio de tudo isto são as discrepâncias do meu vocabulário o que mais me baralha. Tenho que procurar um bom esconderijo e ai permanecer até me lembrar de tudo.
Começo a correr, corro até se me acabarem as forças, a velhinha continua a aparecer em todas as ruas, é impossivel... Terá talvez o poder de teletransportar-se ou então este local é dominado por algum tipo de exército de velhinhas. Ninguém para além de mim parece estar incomodado com isso, até a vejo de conversa com outros transeuntes... Passo por uma grande casa em pedra, é uma igreja, recordo agora que estes são sitios de paz , entro com esperança de alcançar alguma mas assim que passo pela porta lá está a temivel criatura com a caixa de bolos na mão, tapo a cara e grito, estou em pânico total e só uma coisa me resta: continuar a correr.

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